[MN para Johan Vestergaard] Help the old Monroe man

Aqueles não eram tempos fáceis. O caos reinava enquanto a América continuava sendo palco do que parecia uma guerra civil sem precedente. Medo, incerteza, revolta e diversos outros sentimentos conflitantes passaram a predominar... ao menos entre as pessoas que, numa mostra de ousadia e sensatez, haviam se negado a fazer parte dos grotescos experimentos que desestabilizaram a ordem em sociedade, inicialmente praticados por um sujeito controverso — ou, melhor dizendo, insano — através do seu maldito soro. Estas pessoas, aliás, ganharam a alcunha de ulter. Johan era uma delas, e desde então lutava por sobrevivência.

Vagando pelas áreas mais remotas do que antes se tinha como a cidade de Las Vegas, evitando assim locais de maior visibilidade, o rapaz dava continuidade à vida de andarilho que adquirira. Porém dessa vez não estava perambulando à toa; seguia, na verdade, ao encontro do velho Monroe, indivíduo absurdamente rico, impertinente, e um dos seus "clientes". Sim, Johan também se tornara uma espécie de caçador de recompensas, prestando favores arriscados aos desafortunados que se viam impossibilitados de agir por conta própria ou tinham receio de se expor num mundo tão hostil. Levava consigo armas e mantimentos, essenciais nas atuais circunstâncias.

Após longa caminhada, enfim alcançou a residência de Monroe, aonde se dirigia frequentemente às escondidas. Depois de ser identificado pelas câmeras dispostas e então autorizado a entrar, conduziu-se ao interior da casa. Já na ampla sala de estar, foi recepcionado pelo idoso manco, sempre ranzinza e autoritário. Sem cumprimentos banais, logo ambos iniciaram o diálogo de praxe, o que de fato importava, com Johan questionando se Monroe necessitava de algo. Assim que ouviu a resposta do velho, não pôde conter um riso repleto de sarcasmo.

— Sério, Monroe? Quer que eu vá ao cassino em busca de uísque? — indagou, as palavras carregadas de ceticismo, ao passo que o velho meneava a cabeça positivamente e soltava seus tradicionais resmungos. Seria uma missão arriscada a Johan, não apenas pela possibilidade de encontrar um prior no caminho, mas sobretudo porque tratava-se de um serviço envolvendo seu maior vício: o álcool. — Que seja. Mas vou cobrar o dobro do valor habitual. — E deu-lhe as costas, prestes a partir.

"Será uma missão como qualquer outra", pensou Johan após um longo suspiro; estava diante da porta que o conduziria à saída, "e logo eu estarei de volta pra receber a bendita grana." Os primeiros passos então foram dados e ele avançava, mesmo tomado de expectativa — sensação comum em circunstâncias como a de agora. Mas, para a surpresa do rapaz, o tilintar característico de uma chave se fez ouvir atrás de si, detendo-o e em seguida o arrancando do estado de abstração. Virou-se na direção do ruído e avistou Monroe. O velho, sem nada dizer, simplesmente lançou um objeto reluzente na direção do caçador de recompensas, que o fisgou no ar e, ao olhá-lo na palma, identificou a chave de um dos vários carros do seu cliente. Um leve sorriso lhe atravessou os lábios.

— Muita bondade sua, mas... — Johan atirou a chave de volta ao dono —, ... discrição nessas horas é essencial.

Momentos depois ele se encontrava caminhando a passos rápidos e relativamente discretos ao longo do bairro nobre onde realizaria sua nova tarefa. Johan era um sujeito bastante prudente, e sempre que se via na iminência de correr riscos, descartava as opções que pudessem lhe trazer contratempos e priorizava as escolhas que julgava sensatas. Eis por que recusara a ajuda de Monroe. Um carro, embora eficiente, atrairia atenção desnecessária; já a pé, o rapaz poderia selecionar rotas de menor visibilidade e assim realizar um percurso confiável. Nesse instante, por exemplo, evitava as ruas principais e vencia o trajeto através de vias secundárias, apesar destas consumirem mais tempo. Contudo isso não importava, pois ainda que totalmente alheio aos minutos que passavam num piscar de olhos, o ulter pôde distinguir a certa distância o imponente Ace High Casino Rentals, seu destino.

Com a respiração ligeiramente ofegante e o coração um tanto acelerado após o duradouro trajeto até as cercanias do cassino — sobretudo pelo esforço de se manter imperceptível em meio àquela desordem de helicópteros cruzando o céu a todo instante —, Johan enfim se deteve a uma distância precavida da imponente construção a qual pretendia invadir. De onde estava, tratou de avaliar as particularidades do cenário conforme elaborava mentalmente as melhores formas de se infiltrar sem atrair qualquer forma de atenção. Tal procedimento durou poucos minutos. Então, depois de fixar o plano em mente, inspirou o ar denso, assumiu a velha postura cautelosa e, convencido de que chegara o momento de agir, o rapaz logo avançou.

Prosseguindo através da calçada deserta, dava continuidade à missão, quando algo inesperado ocorreu. Enquanto perpassava o trecho do caminho em frente a um beco, entreouviu o ruído de passos apressados a poucos metros de si, atraindo o olhar do ulter. E para espanto dele, que voltou o rosto naquela direção, avistou a silhueta de uma criança antes que esta sumisse do seu campo de visão ao se esconder detrás da caçamba de lixo que havia ali. "Merda... Eu devo estar ficando louco... Uma criança?", pensou, sentindo uma pontada de aflição. Nesse instante, seus olhos passaram a se alternar entre o cassino, tão perto de ser alcançado, e a caçamba. O que fazer? Pretendia buscar o bendito uísque de Monroe, é claro, e concluir o serviço, porém como se sentiria posteriormente, sabendo que deixara de lado alguém inocente? Johan soltou um grunhido de frustração.

— Dane-se o uísque — resmungou em seguida, realizando um desvio no percurso e adentrando o beco. Seguiu a passos sutis na direção do local onde a criança se mantinha oculta. Assim que a encontrou, uma estranha sensibilidade o tomou ao se deparar com a garotinha desamparada e aterrorizada a encará-lo. Ele pousou o dedo indicador sobre os próprios lábios, gesto que sugeria um pedido de silêncio. — Shhh... Não vou machucá-la — falou suavemente, em tom reconfortante. — Eu... me chamo Johan. Você é...? — Ela, mesmo hesitante, apresentou-se como Joana. — Nomes parecidos, hm? — E fingiu um sorriso meigo a fim de tranquilizá-la. — Então, Joana... O que faz aqui sozinha? Está perdida?